O espírito do lugar
Estudei aqui, vindo do "Colégio do Terêncio", meu padrinho, como contei. Era um seminário e também um colégio. Estudavam no colégio os filhos dos mais afortunados e eu tive a oportunidade de naquela altura ser filho numa família que afortunara. Começaram do nada. E ficámos sem nada. No começo quando eu não existia minha mãe chegou a fazer ajour "para fora", porque o infortúnio abateu-se sobre a nossa casa. Mais tarde, comigo já na Faculdade, ter-se-ia que agarrar a modestíssimos empregos para poder haver comida em casa. Pelo meio tivemos do mundo as coisas boas que o mundo tem.
Talvez por isso tenha ficado como marca o misticismo destes missionários, tão longe do execrável cura que mais tarde conheceria e que da Igreja afugenta porque da Igreja é o mau exemplo, a fraternidade destes missionários, a austeridade moral destes missionários. Um dia surgi nas aulas de pulseira de ouro e anel. Prendas de avó. E fio ao pescoço. Olhando-me com ar severo, o Padre Ferreira lançou-me na cara: «vens assim para apoucar os que não têm?».
Nunca mais esqueci. Nunca mais uma peça de ouro. Agora a aliança apenas, símbolo da dedicação.
Se o mundo se divide, de um lado os materialistas, eu estou além. Mesmo dos materialistas históricos e dos dialécticos. Devo-o a este começo, a esta lição, a este lugar.