Era obrigatório e era aos sábados. O instrutor era um oficial branco do Quartel da Companhia Indígena, carregado de ideias patrióticas. Eu era dos mais miúdos de todos e sobretudo o mais pequeno.
Nem sei o bem o que fazíamos naquelas tardes de chatice, pois poucas recordações me ficaram. Lembro sim da farda, camisa verde com o emblema das quinas, o bivaque dentro do qual sobejava na altura uma farta cabeleira, calção de caqui, apertado com um cinto, que quase dava duas voltas ao meu tronco magrinho, com um "S" à frente, que tanto me foi explicado ser de "Salazar", como de "Saber Servir". Mais tarde houve quem dissesse ser a ideia aproximar a coisa às "SS", mas duvido que, franzino e de farta melena a saltar do bivaque, as meias a caírem-me pelas pernas abaixo, apesar de um elástico que lhes dava uma volta ao cano e me deixa uma verdugão nas pernas, tipos da minha laia pudessem, por sonhos que fossem, ser equiparados ao pesadelo dessa tropa de elite nazi, que davam a vida pelo Reich dos Mil Anos e pelo seu Führer, matando e exterminando em nome da mística da pureza racial e do espaço vital, com maior apetite pelos judeus que não tinham certificado de arianeidade.
Fui encontrar esta foto na caixa de sapatos das recordações. Eis-me, fardado da Mocidade Portuguesa. A mesma em cuja criação esteve o general Humberto Delgado.
Naquele dia estávamos no campo de aviação de Malanje, formados em castelo, eu eterno "lusito", à espera do general Kaúzla de Arriaga, o mais à direita dos generais portugueses, que visitava o local. E que depois em Moçambique teria como ajudante de campo o senhor major Tomé. Sim, o mesmo que seria da UDP.
Um dia, na instrução, respondendo à chamada, sei lá porque maluqueira, respondi "presunto", em vez de "presente". Levei uma chapada do alferes instrutor. A partir daí é um buraco negro na memória.
Quando saí para o colégio dos padres, para iniciar o liceu, não havia lá a "bufa". E os meus sábados foram, enfim, libertos da Pátria, por obra de Deus, para me dedicar à Família. Só por isso aqueles padres entraram-me no coração.